Os Arquivos de Ravnica: Parte 1 - Os Golgari
Sejam bem-vindos aos Arquivos de Ravnica.
Aqui vocês terão o completo estudo sobre 5 das 10 guildas de
Ravnica. Serão estudadas: Os Golgaris, Os Boros, Os Dimir, Os Selesnya e os
Izzets. Vocês encontrarão todo o material reunido pelos Tutores, trago direto
de Ravnica. Assim como também estudos sobre esse material e analise dos
mesmos. Será de grande importância estarmos preparados para a nossa futura
viagem a Cidade de Ravnica, e não conseguiremos isso sem ter o total
entendimento sobre o funcionamento das Guildas; mecanismo que rege o modo de
vida, a política e até a cultura do Plano. Cada Estudo sobre Guildas será
dividido em duas partes: a primeira parte sendo a parte técnica, e outra a
parte do Cotidiano.
- Parte Técnica: na parte Técnica passaremos por toda a
estrutura da Guilda estudada no dia, falando sobre suas características, seus
membros e seus objetivos.
- Parte do Cotidiano: olhar apenas o lado genérico, o lado
mais exposto, não é a nossa visão. Aqui faremos uma leitura sobre o Cotidiano
de um membro comum da respectiva Guilda estudada. Mostraremos um exemplo do o
que seria um dia-a-dia na maior Cidade do Multiverso, algo que trará uma
profundidade ainda maior sobre o que é ser membro de uma Guilda.
Com esses dois tópicos vocês, Planeswalkers da Academia
Bacon Arcano, poderão ter não só o entendimento sobre as Guildas, mas também
ter afeição por alguma (ao ponto de se identificar dentro dos próprios
conceitos da Guilda) como ter repulsa (não concordando com os ideais da
mesma).
Esse é Objetivo principal desse trabalho realizado pelos
Tutores, e que começa a ser divulgado hoje: conheçam Ravnica, a Cidade das
Guildas, de uma maneira nunca antes vista.
Em nosso primeiro dia de estudos sobre as Guildas de
Ravnica, iremos ter como objeto de estudo a Guilda Golgari.
ARQUIVOS DE RAVNICA
Arquivo 1: A Guilda Golgari
Parte 1 de 2 –
Técnica
Nome: O Exame Golgari
- CONTEXTO:
Os Golgaris detêm para si uma característica marcante: a
fusão de valores opostos para os termos Vida e Morte. Com isso, o Exame Golgari
acolhe entre os seus participantes diversos dos membros vindos de lugares
decadentes. Os Golgaris se unem como um grande enxame, em constante crescimento.
Um organismo vivo, que se alimenta e cresce em massa, tendo em seu núcleo um
líder, seu centro nervoso, que demanda as ações e toma as maiores decisões em
direção ao crescimento da Guilda; elementos que coletam nutrientes e os convertem
em recursos utilizáveis; defesas que resistem e combatem corpos estranhos; e um
impulso instintivo para sobreviver, reproduzir e superar. Da mesma forma, como
de um lado promovendo o crescimento, do outro, em lugares cheio de vida, os
Golgaris promovem a decadência.
Os Golgaris sempre viveram a margem da sociedade em Ravnica,
sofrendo de um grande preconceito vindo dos membros das demais Guildas e até
mesmo dos ‘’Sem Guildas’’. Com isso, sempre foram levados a viverem nos cantos
mais inóspitos da cidade, tendo como lar os Esgotos de Ravnica nas partes mais
baixas da cidade. Atrás de seus Portões, formados por improvisos de rochas e
vinhas, os membros dividem espaço e crescem em números cada vez mais.
- FUNÇÃO:
O Enxame fornece um serviço extremamente importante para
Ravnica, uma vez que eles se apoderam das carcaças e restos deixados pela
civilização, eles também fornecem alimentos para os esquecidos e necessitados,
acolhendo os mais pobres. Os Golgaris mantem seus Portões abertos a qualquer
um.
Todo o entulho, lixo e restos que é gerado pela Cidade é
pego pelos Golgaris e reaproveitado, sendo reutilizado ao seu máximo. Eles são
os catadores e decompositores nas margens da cadeia alimentar, porém, desejam
ser o predador no topo.
- LIDER:
O líder da guilda de Golgari é atualmente Vraska, um
Planeswalker gorgona preto e verde nativa de Ravnica. Em sua infância viveu
encarcerada pelos Azorius, devido sua origem Golgari, e ascendeu sua centelha
depois de quase morrer nas mãos dos guardas. Dois anos após seu desaparecimento
ela voltou para Ravnica. Em suas viagens, ela aprendeu uma importante lição.
"Uma pessoa deve morrer a morte que merece." Ela começou a reunir
seguidores em sua busca por vingança. Muitos morreram em seu nome, todas as
mortes sempre foram ligadas à forma como viviam suas vidas. Entre suas muitas
vítimas e as de seus seguidores, sempre havia um lugar especial para os
Azorius. Lentamente, ela fez justiça contra aqueles que tinham uma mão na lei,
os guardas, os árbitros, qualquer um que estivesse ligado a eles e sua infância
traumática de qualquer forma. Entre suas missões de vingança sangrenta, ela se
tornou uma espécie de lenda urbana sombria entre os Golgari. Uma característica
marcante da Liderança Golgari é a constante mudanças na liderança; o que ocorre
em menor constância que em outras guildas. A
guilda acredita na importância de ciclos contínuos, entende que o assassinato é
um meio válido de conquista política e sabe que estar vivo não é um
pré-requisito para governar.
- REGIÕES:
Korozda, o labirinto da decadência:_ Korozda é o novo ponto
principal do Enxame, uma catedral em arco rodeada por um imenso labirinto
circular de ruínas cobertas de fungos.
Stonefare: O Stonefare é uma rede de antigos túneis de
tijolos arqueados que serpenteiam através das áreas controladas pelos Golgari
da cidade baixa, poluídos com lodo pegajoso, fungos e teias de aranha. O
Stonefare está alinhado com - e, em alguns lugares, arquitetonicamente composto
- os corpos petrificados das vítimas das gorgonas.
Deadbridge: No centro do bairro de Deadbridge, controlado
pelos Golgari, há um poço grande o suficiente para engolir uma igreja.
Abrangendo o sumidouro está a própria Deadbridge, uma plataforma maciça apoiada
por arcos de pedra que são apoiados por trepadeiras, fungos e madeira.
Deadbridge virou seu nome de uma forma horrível. Depois que um incêndio mortal
destruiu uma vizinhança vizinha, a cova tornou-se uma maneira conveniente e
silenciosa de se livrar de cadáveres. Os Golgari cooptaram o sumidouro como um
repositório de matérias-primas e, eventualmente, a guilda passou a ser de fato
responsável pela região.
Zanikev, a Fazenda Great Rot: Sempre que uma área de
Ravnica está em ruínas, os Golgari procuram varrer, acelerar sua decomposição,
drenar seus recursos, replantar, nutrir e - eventualmente - reivindicar o setor
revivido como seu território. Zanikev é uma zona de recuperação de Golgari
particularmente grande que abrange vários bairros antigos, uma área de ruínas
arquitetônicas cobertas de musgo e sujas de lama, onde muitas espécies de
carniceiros fazem seu covil.
Válvulas de Corpsefloor: Os túneis e câmaras inundados de
pântanos na parte inferior da cidade de Ravnica são também um meio de
transporte para o comércio de cadáveres dos Golgari. Válvulas construídas de
membranas fúngicas fecham certos esgotos. Essas válvulas abrem e fecham com o
comando Golgari, permitindo que carcaças e outros tráfegos flutuem livremente.
- OPINIÕES:
Aqui está um compilado de frases que definem a opinião dos
Golgaris para com as demais Guildas:
Azorius: "Para o Azorius, nós somos processos de
fundo. Nós somos sons de estômago e eflúvio. No entanto, somos a base sobre a
qual seu poder repousa."
Orzhov: "Os Orzhov são fantasmas desprezíveis, sempre
procurando contornar os ciclos que nos recebem de volta à marga. Sua arrogância
em buscar poder sobre a decadência não deve durar tanto tempo."
Dimir: "Os Dimir compartilham nossos túneis e nossos
segredos. Eles acreditam que eles governam as Cidades Baixas, mas eles só
governam aqueles que se importam com bens ou status.
Izzet: "Os métodos dos Izzet fedem ao progresso
social; ignoram os ciclos que destroem. Mas administram a cidade como nós,
fornecendo magias úteis para manter as estruturas sob as estruturas".
Rakdos: "Os Rakdos compreendem a proximidade da
morte, mas procuram apressar seu ciclo para fins mesquinhos. O que o demônio
destrói, nos alimentamos de volta à vida novamente."
Gruul: "Os Gruul são nossos irmãos - selvagens
indomáveis da cidade. Mas carecem da visão para perceber os ciclos maiores em
ação".
Boros: "Os Boros falam uma língua que nunca
entenderemos. Sua dedicação militante a palavras e slogans nos confundem e
perturba".
Selesnya: "Os Selesnya se esforçam para respeitar a
natureza como nós, e sua devoção aos sistemas vivos é louvável. Mas eles são
necrófobos cegos à noite, inúteis diante da morte sem verniz."
Simic: "O Simic passou gerações raspando nas bordas
de uma verdade que é clara para qualquer verme."
- AS MAGIAS GOLGARI:
Nessa sessão vocês poderão ter uma breve visão dos estilos
das magias do Enxame Golgari, podendo assim usar esse estudo a favor de vocês,
mantendo-se salvos de situações de possível confronto com a Guilda, como também
usar das próprias magias para se protegerem.
1 - Molderhulk
Aqui temos uma criatura Fungo Zumbi de 9 manas, sendo 7
incolores, uma verde e uma preta. Ele tem 6 de poder, e 6 de resistência. Nele
temos uma magia que traz a nova mecânica dos Golgari: Undergrowth. Em
Português: Necronutrimento.
Com o Necronutrimento você terá um benefício grande conforme
a quantidade de criaturas que possuir no seu cemitério. Quanto mais criaturas
no cemitério, maior o benefício! Tem algo mais Golgari que isso? No Molderhulk
por exemplo, você terá uma boa diminuição em seu custo de mana. Para cada
criatura que você tiver em seu cemitério, uma mana genérica a menos. Podendo
assim o Molderhulk chegar a custar até 1 mana preta e 1 mana verde apenas!
Como se fosse pouco, ele detém uma segunda habilidade: ao
entrar no campo de batalha, você retornará uma carta de Terreno de seu cemitério
para o campo!
- Status/ Statue
Ravnica traz consigo a volta dos Split Cards! Esses
incríveis cards 2 em 1, onde, em apenas um card, você poderá optar por uma de
suas duas boas opções.
De um lado, Status, por uma Hibrida preta ou verde (você
poderá pagar ou uma, ou outra) você tem uma instantânea com o seguinte efeito:
A criatura alvo ganha +1/+1 e toque mortífero até o final
do turno.
Algo que pode ser bem versátil para pegar um oponente de
surpresa em um combate!
Já no lago Statue temos, por 4 manas, sendo 2 genéricas, uma
verde e uma preta, uma instantânea com o seguinte efeito:
Destrua o artefato, criatura ou encantamento alvo.
Uma boa gama de opções de permanentes que podem ser mandadas
diretas para o cemitério!
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ARQUIVOS DE RAVNICA
Arquivo 1: A Guilda Golgari
Parte 2 de 2 – O Cotidiano
Conto 1 - Duas Lapides
Acordei cedo para cumprir a proposta que eu mesmo havia me feito. Porém o desânimo foi a primeira coisa a me encontrar ao abrir dos olhos. Normalmente não sei como se referir ao que tenho como cabelos ou tentáculos, mas hoje com certeza estão horríveis. Meu rosto parecia mais um erro. E eu não fazia ideia do o porquê era preciso se arrumar parar coisas assim. E nem como me arrumaria. Coloquei as vestimentas mais normais que consegui imaginar em um curto espaço de tempo e me sentei.
O que faziam em momentos assim? Lá em cima, eu pensei.
Lá em cima... Me levantei e fui até um dos blocos de pedra da parede. Afastei o musgo e o puxei, como de costume meu pequeno baú de madeira estava lá. Coloquei minha mão sobre sua trava, um misto de raiz podre com um forte veneno embutido. Seu lacre se desfez, e um forte e repulsivo cheiro subiu às minhas narinas. Aquilo nunca perdia a graça; uma suavidade que poderia ser apreciada em vida por poucos. Em um dos cantos do baú jazia um punhado de insetos dessecados, apreciava as cores de suas asas, e os guardava e conservava dês de pequena. No outro canto, pequenas raízes venenosas difíceis de serem achadas, por cima delas pequenos botões de alfaiates que um dia haviam caídos em diferentes pontos do esgoto, e no meio, três moedas de bronze que eu não sabia por que um dia guardei.
Coloquei as moedas no bolso e fechei o baú. Com um pouco de musgo da parede mais uma velha rama do chão, refiz a fechadura e pus o bloco de pedra em seu lugar. Olhando pelas grades de ferro da parede vi que boa parte do pessoal ainda não se encontrava em suas selas. Dei graças por ter mudado meu turno e acordado cedo. Fui em direção ao Portão Central evitando o caminho principal. Através dos grandes corredores paralelos meus passos ecoavam se distanciando de minha cela. Gotas d'Água se desprendiam da parede oval esverdeada escura, e pingavam em cantos que não podiam ser vistos.
Início uma íngreme subida. Nós os Golgaris sempre nos acostumamos a viver a baixo de todo o resto, tanto moralmente como fisicamente. Talvez isso explicasse o porquê chamar nossos quartos de selas era algo tão normal. Pois, de fato, eles se pareciam muito com uma. Eram antigas instalações de reserva de equipamentos e manutenção dos grandes esgotos de Ravnica. Pequenos cubículos de metal, e janelas com grades, que hoje era o pouco espaço privado de cada um de nós. Nos do Enxame, não ligávamos mesmo para isso, para o que os outros poderiam dizer sobre nossas selas, nossa existência a baixo da margem ou modo de vida peculiar. Porque, no fim, presos aqui, somos mais livres do que qualquer Guilda. Aqui nos esgotos temos tudo o que precisávamos: tudo o que todos os outros já não mais querem. Andar por esses corredores é ter na cabeça a sorte de a qualquer momento encontrar algo preciosíssimo; nada é descartável.
Passo pelo Portão principal, o dia amanhecia no horizonte distante.
É Outono na Cidade.
As ruas ficam cheias de cores mais mortas que o normal. Um misto de laranja com vermelho que deixam a visita à superfície menos aterradora. Eu caminho em direção aonde um dia me disseram que colocam coisas a venda. Uma estranha espécie de venda aberta. A essa hora da manhã às ruas ainda estão vazias, o que não diminuiu o número de olhares cortados que recebo ao caminhar. Deixo o meu penteado mais jogado ao lado, achando que isso melhoraria algo. Eu apenas quero andar tranquila.
Barracas e pequenas mesas de madeira se estendem em um dos corredores da Cidade, ali itens dos mais variados tipos estão a amostra para alguns poucos curiosos que já se dispunham a essa hora da manhã. Creio ser o lugar que eu procurava. Eu caminho pelas bancas, sendo estranhamente olhada por vários dos comerciantes. Uma Centauro passa pelo meio do corredor de vendas, ela está distribuindo vários dos papeis que carrega em mãos, chamando a atenção de todos com o seu tamanho; e talvez pela quantidade de bichos que a seguem. É a minha chance de fazer isso rápido: raízes bem comuns para o meu gosto, estranhas conservas que me chamam a atenção. Uma caneta pena muito bela me faz pausar por um momento. Observo seu brilho azulado. Seria algo que se achado nos esgotos, eu guardaria no melhor canto de minha sela. Seus contornos dourados, somados ao azul de sua ponta subindo até o final da grande pena eram belíssimos. Saio do meu transe e lembro de meu objetivo.
Livros empoeirados, poções variadas, artigos usados, uma banca de flores ornamentais. Eu subitamente paro e passo a olhar.
Balanço a cabeça automaticamente. Todas são tão coloridas. Uma grande e vermelha flor com suas folhas delicadas crescendo em volta. Em outro vaso, uma azul lilás, outra amarela. Tudo muito... demais. E então é que, no meio dessa explosão toda, uma delicada e esguia saprofita se repousa. Ela é verde escura como o musgo dos corredores do Enxame. Era do tom da minha pele. Eu a olho atônita por mais um momento, e então olho para o homem atrás da banca. Ele estava me encarando, mas não do modo costumeiro que a maioria fazia. Ele só parecia... curioso.
E é aí que me dou conta de que não faço ideia de como agir.
Olho para os lados. Numa banca próxima, uma senhora olha para algumas frutas e pergunta ao vendedor
"Quanto custa?"
Eu automaticamente me viro para o homem a minha frente e digo
"Quanto custa?"
Ele subitamente parece sair do transe em que estava ao me observar e me olha como se acabasse de chegar ao planeta.
"Hã... qual?"
"Essa." eu digo, apontando para a pequena saprofita.
"Oh, essa é uma belíssima Saprofita Lamaie. De fato um espécime muito, muito rara. Custa uma moeda de ouro."
Eu abro minhas mãos e olho bem minhas três moedas de bronze. Como as pessoas normalmente resolvem esse tipo de situação? Eu penso. Fecho meu punho, olho para a saprofita. Eu penso. "É..." eu penso, penso. Penso no homem me olhando estranho agora nesse momento. Fico nervosa, olho para os lados. Penso em todos me olhando agora.
Fico nervosa.
Nenhuma resposta.
Eu fecho meu punho ainda mais forte, bato a mão aberta na mesa com as três moedas. Pego a Saprofita e saio dali o mais rápido possível.
-
No topo da colina se repousa um dos maiores cemitérios da Cidade de Ravnica. Ajoelhada aqui, eu consigo ver os grandes picos da cidade se abrindo aos céus. Eu vejo o verde da grama do cemitério, vejo o amarelo avermelhado de todo o resto, as folhas de outono caem mais lentas esse ano. Ou seria só impressão minha? Na minha frente, duas lápides se repousam bem fixadas ao chão. Eu havia prometido estar aqui há um ano. Há um ano estou atrasada. Mas eu não ligo, pois nós não sentimos. Mas aquelas lápides estão tão presas no chão; sem possibilidade de retorno...
"mãe, pai..." eu murmuro baixinho.
Eu acaricio a pequena saprofita em meu colo, e sem perceber, evito olhar diretamente a minha frente. No fim do horizonte, olho os picos dos prédios, tão altos e tão longos, eles ficam azuis com a neblina que cobre a cidade ao amanhecer. Eu pisco meus olhos perante tamanha magnitude, e limpo com as costas das minhas mãos os meus cílios.
‘’Por causa da minha condição meus pais verdadeiros me viram como algo estragado e sem valor. E quando vocês me acharam abandonada nas ruas, me viram como um tesouro brilhante.’’
Olho para o meu colo, passo meus dedos entre as minúsculas flores daquela pequena saprofita. Uma gota d'Água cai em minha mão. Está chovendo. Avisto o céu sobre mim, mas está tudo tão claro.
Levo as mãos ao rosto e meus olhos estão completamente molhados.
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ARQUIVOS DE RAVNICA
Arquivo 1: A Guilda Golgari
Parte 2 de 2 – O Cotidiano
Conto 1 - Duas Lapides
Acordei cedo para cumprir a proposta que eu mesmo havia me feito. Porém o desânimo foi a primeira coisa a me encontrar ao abrir dos olhos. Normalmente não sei como se referir ao que tenho como cabelos ou tentáculos, mas hoje com certeza estão horríveis. Meu rosto parecia mais um erro. E eu não fazia ideia do o porquê era preciso se arrumar parar coisas assim. E nem como me arrumaria. Coloquei as vestimentas mais normais que consegui imaginar em um curto espaço de tempo e me sentei.
O que faziam em momentos assim? Lá em cima, eu pensei.
Lá em cima... Me levantei e fui até um dos blocos de pedra da parede. Afastei o musgo e o puxei, como de costume meu pequeno baú de madeira estava lá. Coloquei minha mão sobre sua trava, um misto de raiz podre com um forte veneno embutido. Seu lacre se desfez, e um forte e repulsivo cheiro subiu às minhas narinas. Aquilo nunca perdia a graça; uma suavidade que poderia ser apreciada em vida por poucos. Em um dos cantos do baú jazia um punhado de insetos dessecados, apreciava as cores de suas asas, e os guardava e conservava dês de pequena. No outro canto, pequenas raízes venenosas difíceis de serem achadas, por cima delas pequenos botões de alfaiates que um dia haviam caídos em diferentes pontos do esgoto, e no meio, três moedas de bronze que eu não sabia por que um dia guardei.
Coloquei as moedas no bolso e fechei o baú. Com um pouco de musgo da parede mais uma velha rama do chão, refiz a fechadura e pus o bloco de pedra em seu lugar. Olhando pelas grades de ferro da parede vi que boa parte do pessoal ainda não se encontrava em suas selas. Dei graças por ter mudado meu turno e acordado cedo. Fui em direção ao Portão Central evitando o caminho principal. Através dos grandes corredores paralelos meus passos ecoavam se distanciando de minha cela. Gotas d'Água se desprendiam da parede oval esverdeada escura, e pingavam em cantos que não podiam ser vistos.
Início uma íngreme subida. Nós os Golgaris sempre nos acostumamos a viver a baixo de todo o resto, tanto moralmente como fisicamente. Talvez isso explicasse o porquê chamar nossos quartos de selas era algo tão normal. Pois, de fato, eles se pareciam muito com uma. Eram antigas instalações de reserva de equipamentos e manutenção dos grandes esgotos de Ravnica. Pequenos cubículos de metal, e janelas com grades, que hoje era o pouco espaço privado de cada um de nós. Nos do Enxame, não ligávamos mesmo para isso, para o que os outros poderiam dizer sobre nossas selas, nossa existência a baixo da margem ou modo de vida peculiar. Porque, no fim, presos aqui, somos mais livres do que qualquer Guilda. Aqui nos esgotos temos tudo o que precisávamos: tudo o que todos os outros já não mais querem. Andar por esses corredores é ter na cabeça a sorte de a qualquer momento encontrar algo preciosíssimo; nada é descartável.
Passo pelo Portão principal, o dia amanhecia no horizonte distante.
É Outono na Cidade.
As ruas ficam cheias de cores mais mortas que o normal. Um misto de laranja com vermelho que deixam a visita à superfície menos aterradora. Eu caminho em direção aonde um dia me disseram que colocam coisas a venda. Uma estranha espécie de venda aberta. A essa hora da manhã às ruas ainda estão vazias, o que não diminuiu o número de olhares cortados que recebo ao caminhar. Deixo o meu penteado mais jogado ao lado, achando que isso melhoraria algo. Eu apenas quero andar tranquila.
Barracas e pequenas mesas de madeira se estendem em um dos corredores da Cidade, ali itens dos mais variados tipos estão a amostra para alguns poucos curiosos que já se dispunham a essa hora da manhã. Creio ser o lugar que eu procurava. Eu caminho pelas bancas, sendo estranhamente olhada por vários dos comerciantes. Uma Centauro passa pelo meio do corredor de vendas, ela está distribuindo vários dos papeis que carrega em mãos, chamando a atenção de todos com o seu tamanho; e talvez pela quantidade de bichos que a seguem. É a minha chance de fazer isso rápido: raízes bem comuns para o meu gosto, estranhas conservas que me chamam a atenção. Uma caneta pena muito bela me faz pausar por um momento. Observo seu brilho azulado. Seria algo que se achado nos esgotos, eu guardaria no melhor canto de minha sela. Seus contornos dourados, somados ao azul de sua ponta subindo até o final da grande pena eram belíssimos. Saio do meu transe e lembro de meu objetivo.
Livros empoeirados, poções variadas, artigos usados, uma banca de flores ornamentais. Eu subitamente paro e passo a olhar.
Balanço a cabeça automaticamente. Todas são tão coloridas. Uma grande e vermelha flor com suas folhas delicadas crescendo em volta. Em outro vaso, uma azul lilás, outra amarela. Tudo muito... demais. E então é que, no meio dessa explosão toda, uma delicada e esguia saprofita se repousa. Ela é verde escura como o musgo dos corredores do Enxame. Era do tom da minha pele. Eu a olho atônita por mais um momento, e então olho para o homem atrás da banca. Ele estava me encarando, mas não do modo costumeiro que a maioria fazia. Ele só parecia... curioso.
E é aí que me dou conta de que não faço ideia de como agir.
Olho para os lados. Numa banca próxima, uma senhora olha para algumas frutas e pergunta ao vendedor
"Quanto custa?"
Eu automaticamente me viro para o homem a minha frente e digo
"Quanto custa?"
Ele subitamente parece sair do transe em que estava ao me observar e me olha como se acabasse de chegar ao planeta.
"Hã... qual?"
"Essa." eu digo, apontando para a pequena saprofita.
"Oh, essa é uma belíssima Saprofita Lamaie. De fato um espécime muito, muito rara. Custa uma moeda de ouro."
Eu abro minhas mãos e olho bem minhas três moedas de bronze. Como as pessoas normalmente resolvem esse tipo de situação? Eu penso. Fecho meu punho, olho para a saprofita. Eu penso. "É..." eu penso, penso. Penso no homem me olhando estranho agora nesse momento. Fico nervosa, olho para os lados. Penso em todos me olhando agora.
Fico nervosa.
Nenhuma resposta.
Eu fecho meu punho ainda mais forte, bato a mão aberta na mesa com as três moedas. Pego a Saprofita e saio dali o mais rápido possível.
-
No topo da colina se repousa um dos maiores cemitérios da Cidade de Ravnica. Ajoelhada aqui, eu consigo ver os grandes picos da cidade se abrindo aos céus. Eu vejo o verde da grama do cemitério, vejo o amarelo avermelhado de todo o resto, as folhas de outono caem mais lentas esse ano. Ou seria só impressão minha? Na minha frente, duas lápides se repousam bem fixadas ao chão. Eu havia prometido estar aqui há um ano. Há um ano estou atrasada. Mas eu não ligo, pois nós não sentimos. Mas aquelas lápides estão tão presas no chão; sem possibilidade de retorno...
"mãe, pai..." eu murmuro baixinho.
Eu acaricio a pequena saprofita em meu colo, e sem perceber, evito olhar diretamente a minha frente. No fim do horizonte, olho os picos dos prédios, tão altos e tão longos, eles ficam azuis com a neblina que cobre a cidade ao amanhecer. Eu pisco meus olhos perante tamanha magnitude, e limpo com as costas das minhas mãos os meus cílios.
‘’Por causa da minha condição meus pais verdadeiros me viram como algo estragado e sem valor. E quando vocês me acharam abandonada nas ruas, me viram como um tesouro brilhante.’’
Olho para o meu colo, passo meus dedos entre as minúsculas flores daquela pequena saprofita. Uma gota d'Água cai em minha mão. Está chovendo. Avisto o céu sobre mim, mas está tudo tão claro.
Levo as mãos ao rosto e meus olhos estão completamente molhados.
Arte: Raquel Araujo







Que pesado ;--; e bonito...
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